domingo, 19 de abril de 2009

Aparências e vaidades

Ainda na sexta-feira passada, sentada no autocarro, o meu olhar encontra uma flor de plástico no cabelo de alguém. Pensei cá para mim: «olha, até que fica bonito».


Como pessoa que nunca seguiu modas e não dá importância ao aspecto, também nunca me fez espécie aquilo que os outros pensam do que uso ou aquilo que os outros pensam do que os outros usam. Não é comum ver uma jovem que já não é menina com uma flor de plástico no cabelo. Que a usasse porque sentia vontade, era para mim algo com que posso me identificar.

Mas eis que o autocarro faz uma curva e o assento que tapa o resto da minha visão altera a perspectiva. E então vejo o resto deste cenário. Surge um dado novo no campo visual: a presença de um espelho! A rapariga segurava diante do seu rosto, um espelho duplo redondo, no qual se demorava em contemplações. Estava estática naquela posição. Uns bons instantes depois, decide sair daquele "transe hipnótico" para ajustar uma mecha do cabelo pintado de castanho claro, e volta ao estado de contemplação do seu próprio reflexo.


Já não simpatizei tanto com o que vi. Não se pode julgar pelas aparências e decerto que, se a conhecesse, não a julgaria de antemão. Mas já não achei a flor tão bonita no cabelo de uma pessoa tão envaidecida. É quase um desperdício. O aparente excesso de vaidade não é uma característica que considero atraente. Penso que denuncia uma pessoa que "vai abaixo" com facilidade. Uma pessoa com tendência a importar-se em demasia com as coisas mais fúteis da vida. Uma pessoa fraca. Já todos conhecemos a história de Narciso que, para contemplar o seu reflexo nas águas do lago, acabou por cair e afogar-se. Esta rapariga mirava-se ao espelho com idêntica contemplação.

E por falar em aparências e vaidades, outra surpresa desta sexta-feira, ainda que fora dos transportes públicos, foi ter visto no youtube o vídeo da participação de Susan Boyle no concurso de talentos. Fui ás lágrimas! E tremi, de emoção. Isto pela forma como a sua voz deu vida àquela música, já por si tão emocional.

Mas o aspecto que não passou despercebido a ninguém, foi a rendição de toda aquela plateia à sua voz, quando apenas uns intantes antes, estavam a ridicularizá-la através de múltiplas expressões de reprovação à sua aparência e aspirações. Mulher de 47 anos vinda de um lugar pequeno, sem vaidade, nunca casou ou teve namorado porque cresceu com alguns estigmas e ficou a cuidar da mãe. Cabelos na cor natural, sobrancelhas originais, vestido bonito para o momento de festa, um rosto que leva a suspeitar um antecessor problema fisiológico qualquer, e uma genuína simplicidade e alegria que a maioria já perdeu - estavam todos a avaliar pelo exterior e a reprovar. Quando se preparavam para o pior, Susan abre a boca e a voz que sai da sua garganta é tão poderosa, que leva uma imensa plateia e os elementos do júri ao extâse. Que lindo!


Se a mãe de quem Susan cuidou até à morte a incentivava a entrar no programa, decerto que teve um dedinho dela ali naquele momento. Deve ter pensado: "Minha filha, este momento é todo teu! O mundo vai perceber a pessoa maravilhosa que tu és!"
O que aconteceu naquele palco foi mágico. Susan dominou todos com o encanto da sua voz. E também esteve muito bem na interpretação. Eu fui às lágrimas e tenho cá para mim que alguns elementos do júri tiveram de se segurar para não lhes acontecer o mesmo.


Magnífico! Não se devia mesmo julgar as pessoas pela aparência. É tão limitador e estúpido! É que podem-nos passar ao lado pessoas lindas. E nós, que buscamos intensamente outras pessoas que nos completem, com a sua amizade e afecto verdadeiro, deixamos tudo escapar por só estarmos a procurar pela "casca" e não pelo "recheio".


Veja o vídeo inteiro e espreite também os mais interessantes sites sobre o assunto:

http://5dias.net/2009/04/18/susan-boyle/ (análise do fenómeno e opinião do elenco de Los Miserábles em Londres)
http://en.wikipedia.org/wiki/Susan_Boyle (A vida de Susan na Wikipédia)

7 comentários:

  1. Eu nunca segui modas, mas tenho verdadeira loucura por trapos... também não me ralo com o que os outros pensam do que uso, mas escolho cuidadosamente cada peça... e se espreito a roupa alheia é para tirar ideias eheh, vou muito vadosa, mesmo!! E usei flores de plástico no cabelo, tinham era de ser bem feitas, com as pétalazinhas de tecido, bem feitinhas... agora menos, mas de vez em quando, lá vai!!

    Ahahaha, era narcisista; sabes, gosto de pessoas que têm auto-estima elevada... não que se achem sempre donas da verdade, mas acho que é bonito ter brio... eu ergo espelhos diante de mim para maquiar-me no carro quando estou atrasada ahahah!! E depois contemplo, a ver se com as oscilações do caminho não esborratei nada (e olha que normalmente não esborrato!!) :-D

    Vou confessar-te... não me considero uma pessoa minimamente fútil, mas as coisas fúteis da vida deliciam-meee!!

    Por acaso não tenho a mesma ideia que tu; sempre vi as pessoas que têm orgulho em si e na sua imagem como portadoras de uma boa auto-estima... sei que, contudo, nem sempre é assim, e compreendo o teu ponto de vista...

    Mas já fui uma pessoa cuja auto-estima não era grande coisa e que se vestia sem qualquer brio, e que não tinha qualquer vaidade pois achava que não havia motivo para isso... e digo-te, hoje sou bem mais feliz!! :-))

    Eu concordo em absoluto contigo; os americanos são horríveis e de facto dão imensa importância às aparências; não é porque gosto de roupa e de me divertir ao vestir-me que vou ter menos consideração por uma pessoa que não tenha lá assim grande aspecto... francamente, acho que não tem nada a ver... e acho que não sou minimamente influenciada por isso, nunca fui...

    Beijinhos, já estava a ficar saudosa de uns posts teus!! :-D

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  2. Olá!

    Bons olhos a «leiam»!

    Também compreendo o teu ponto de vista. Para dizer a verdade, o tempo trouxe-me a consciência que a aparência abre portas e facilita a vida. Mas continuo a não ter brio. Talvez por querer que olhem para dentro e não se distraiam com a parte de fora.

    A meu ver, existe 2 tipos de preocupação com a aparência. Os que se vestem para si mesmos e os que se vestem para não ir contra a moda e infrigir as "regras" que ditam o que se deve ou não usar.

    E não, não acho nada estranho não borrares a pintura! As mulheres têm uma capacidade extraordinária de coordenação. Mas não recomendo que o faças em andamento...

    Jinhos!
    Volta sempre!

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  3. Olá. Gostei muito deste texto. O video já tinha visto ( mas foi a 1ª vez que vi com legendas) e também me levou ás lágrimas. É uma verdadeira história de Cinderela...
    Beijinhos

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  4. É uma bonita história. O tipo que as pessoas gostam de ver no cinema. Obrigada pelo elogio ao texto (mesmo com um ou outro erro :))

    Recomendo que dêm uma vista de olhos nos links disponibilizados. Encontrei coisas surpreendentes por lá. É incrível as coisas que rapidamente apareceram na net graças a este momento da Susan Boyle. Vivemos mesmo numa época priveligiada, neste sentido.

    Através deles encontrei e ouvi a única música que ela gravou em disco, 10 anos antes. Olha, eu fiquei agarrada! Há 10 anos atrás, a voz dela era ainda mais bonita! Mais cristalina. E tinha apenas 37 anos...

    Uma alma que lembra todos os talentos perdidos por aí.

    Obrigada e volta sempre!

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  5. Também eu gostei deste último texto e já dei uma olhadela nos restantes porque só hoje conheci este blogue e já nem sei bem como aqui vim parar, mas chegado a este ponto, pergunto: Será que só há coisas más nos autocarros da Carris??? Ou apenas o que é mau interessa referir?. Continuação de bons posts

    Cumprimentos,
    RS

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  6. Bem vindo/a e espero que volte mais vezes. Obrigada por gostar. Respondendo à questão que coloca: não. Não só "coisas más" que acontecem nos autocarros da Carris merecem referência. Também quero as boas!

    Por exemplo: correr para apanhar o autocarro e o motorista esperar uns segundos para nos deixar entrar. Isso é bom! Nem sempre acontece mas quando acontece, também merece referência. Ainda não explorei bem nenhuma destas 2 situações num post.

    Os temas são espontâneos, fruto daquilo que sobressai num dia inteiro de peripécias. Ficam de fora outras coisas, tanto "positivas" como "negativas", de ambos os lados da questão.

    Cumprimentos

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  7. Ahahah, tens razão nisso que dizes quanto às mulheres!! Mas eu ponho a maquiagem em andamento mesmo, rimel e lápis e tudo!! :-P (mas só em certas partes da estrada, ou então na auto-estrada!! :-D)

    Sim, compreendo bem o que queres dizer quanto á moda... para mim os trapos são uma maneira de me expressar face ao mundo... de transmitir uma mensagem... eu tenho brio no sentido em que gosto de ver-me arranjada e ter no final a mesma sensação que se tem quando se escreve um bom texto... quando olho e vejo uma pequena obra de arte... tenho brio mas é como se não tivesse; a minha maneira de vestir confunde e surpreende as pessoas; acho que essa é a minha forma de lhes pedir que vejam o interior, não só o meu, mas sobretudo o delas próprias... visto-me de preto muitas vezes, com um aspecto semi gótico, semi metal, mas depois vou ao extremo oposto e quando todos já têm uma ideia pré-concebida a meu respeito, eu surpreendo com uma roupa formal e extremamente delicada... mas em nenhum dos casos sou socialmente correcta ahahahah!! A minha forma de vestir é a minha forma de atentar contra preconceitos e contra regras de moda e regras sociais superficiais que desprezo e desvalorizo... :-P

    :-D Beijinhos, vizinha!!

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