sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Burguês chega, escolhe e manda!



Estava no autocarro, sentada num banco individual, de costas, diante de outro banco ocupado por uma senhora. Viajavamos frente uma à outra, estando eu no sentido contrário ao do movimento do veículo.


.Uma paragem depois, a viatura pára e abre as portas para deixar entrar passageiros. A mulher olha para a frente com um ar sério e levanta-se com uma agilidade para mim inesperada. Penso que é para ceder lugar a alguém que vem a entrar mas esse alguém, que não vejo, senta-se do outro lado, nos lugares prioritários, assinalados a vermelho, para idosos e mulheres grávidas ou com crianças.


.O autocarro vai quase vazio. Existem lugares disponíveis por todo o seu comprimento de autocarro articulado. Mas quem se sentou ao meu lado, depressa se levanta para ocupar a cadeira deixada livre pela senhora à minha frente. É a dança da cadeiras!... Só então vejo quem são os ocupantes: uma senhora com uma criança de uns 2 anos.

.
Ela senta-se e põe a criança ao colo. O que achei bem, porque era pequena demais e devia viajar amparada, principalmente no autocarro em causa, semelhante ao da foto, com a diferença de ser articulado e dos bancos serem só de plástico cinzento e não terem a protecção lateral que se vê na imagem. Ali, um abano forte e pessoa que não tenha os pés firmes no chão desliza e voa! Era o que eu estava a fazer: força nos pés, para o corpo não balançar com o movimento do veículo. A criança seria projectada com total facilidade se ocupasse uma cadeira sozinha, como aquelas que estavam nos assentos de onde se tinham levantado, na área vermelha.


.Mas eu comecei a desconfiar, pela postura da mulher, que queria que eu saísse dali. Falava alto com a criança, num tom que conheço bem e raramente se dirige à criança. Não a mirei mas, de alguma forma, senti um olhar penetrante. Reparei nos lugares vazios e com assentos lado-a-lado, onde a senhora, se quizesse colocar a pequena criança numa cadeira, poderia usar o braço como cinto de segurança nas muitas travagens e solavancos que o autocarro fazia.


.Quando estava quase a chegar ao meu destino, a impressão que a senhora estava a desejar que eu saísse dali a cada paragem feita pelo autocarro, já estava quase confirmada. Subitamente achei aquela postura revoltante. Com tantos lugares vagos, dar-se a ares que me queria mandar sair dali, como se fosse sua vassala! Pensei seriamente em fazer o percurso até a paragem terminal, não me custaria nada. Ela que fosse "galar" um assento vago, ora o descaramento! Nos lugares inicialmente por ela ocupados, pessoas sentavam e levantavam. Era só lugares a vazar. Bons lugares, lado a lado. Mas ela parecia cobiçar aquele que eu ocupava. A criança não está tão protegida sozinha numa cadeira fora do alcance de um abraço. Aquilo mexeu comigo!


A mulher era relativamente jovem, mas era a avó da criança, cujos pés quando sentada no joelho da avó, mal lhe chegavam a meio das pernas. Ao mudar de lugar, a criança disse que queria sentar-se ajoelhada... pobrezinha. Teria ido logo ao chão! A avó responde-lhe, com aquele tom que é para outros ouvirem, que não pode, porque ia sujar a cadeira. E eu pensei cá com os meus botões: não pode porque iria cair, bater com a cabeça e no mínimo ir para o hospital! E não porque suja o assento... até a criança foi mais perspicaz e responde há avó que "magoava-se com sangue" se fosse de joelhos na cadeira...


Chega a minha saída e deixo de lado a má impressão que aquela senhora me estava a passar. Levanto-me e saio, ignorando a vontade de seguir até ao fim sem sair do lugar que a mulher estava a cobiçar. Com tantos vagos, sinceramente! É certinho: ela pega na criança e projecta-a para o assento da frente. Só a oiço gritar "espere um momento!" - para o motorista, que se preparava para avançar com o autocarro. O que só reforça o perigo que a criança, pequena e sozinha num banco onde um adulto não a pode segurar, corre com cada viragem do autocarro.

,
Segui caminho a pensar nas curvas na rotunda, nas curvas rápidas, no acelerar e nas travagens e aquela criança "solta" no banco, pronta para um acidente onde podia "magoar-se com sangue".
,

Há pessoas que se acham burguesas e sentem que têm direito de mandar nas outras. Esta senhora, certamente se encaixa no perfil. E também não deve ser das avós mais satisfeitas do mundo, pois não pareceu falar com a criança nesses modos. Ao colocá-la sozinha na cadeira... posso até estar equivocada, o que é bem possível. Mas a impressão que passou foi outra. Terá feito a viagem sem acidentes?


3 comentários:

  1. É preciso uma lata, com tanto lugar livre e queria logo aquele. Se não estava contente mudasse de autocarro, podia ser que tivesse "melhor sorte" e fosse de pé.

    ResponderEliminar
  2. Boa foto, tirado no interior da carreira 54 no Campo Pequeno.

    ResponderEliminar
  3. Não faço ideia de onde foi tirada e qual a carreira... tive apenas o cuidado de escolher uma foto sem rostos identificáveis

    ResponderEliminar

Se veio até aqui por saber o que é andar diariamente num autocarro da Carris... somos solidários!