quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Recanto de paz em perigo de extermínio?

A caminho da paragem do autocarro, avistei uma coisa insólita, que me deixou numa tristeza duradora. Uma hora depois de avistar o que vi, ainda estava mergulhada numa lamento profundo.


Mas o que vi? Para a maioria nada de mais, suponho... mas para mim, foi como se algo que gosto muito estivesse a ser ameaçado de deixar de existir. Penso que é o caso.

O que vi foi um sinal de trânsito no meio de um caminho de jardim. E depois vi outro, e depois outro. Em ambos os sentidos, sinais de trânsito! Naquele caminho que, pessoalmente, considero a parte mais gostosa do percurso. Um pequeno jardim - nem assim se pode chamar, não fossem os muitos arbustos e as muitas árvores aí plantadas parecerem querer reclamar para si essa condição.


Este pequeno caminho por entre os arbustos e árvores sempre me deliciou. Há mais de uma década dei por mim a confessar a uma amiga que este torço era a parte mais relaxante do meu percurso, o lugar onde podia respirar fundo e sentir o aroma da natureza. Na altura tinha de esperar um autocarro na avenida Infante D. Henrique, junto à linha de comboio semi-utilizada (?), numa paragem praticamente inexistente, que consiste apenas no varão metálico com a placa identificativa. O espaço de chão que este precisa, é o espaço que o peão tem. A distância entre mim e o incessante passar do trânsito, praticamente não existe. Além disso, vinha do local de trabalho, com um ar circulante quase irrespirável. A lei da proibição do fumo no interior de edifícios ainda estava longe de entrar em vigor e todos fumavam na sala de espera, lugar sem janelas. A concentração do fumo dos tabacos era tanta, que até a visibilidade ficava perturbada. Após 8 horas desse martírio, sair para a rua sabia bem. Não fosse a paragem de autocarro situar-se praticamente na avenida e ter os veículos a passarem rentes a mim. Por isso, quando chegava ao meu destino, a "salvação" de todo este martírio, era me dada, como que um presente, por aquele pequeno pedaço de caminho relvado, ladeado de árvores e arbustos que, na Primavera, se enchem de muitas flores brancas, dando ao percurso aromas perfumados e alegria. Sempre me lembrava da lenda das amendoeiras, que o nosso rei mandou plantar para aplacar a nostalgia da sua raínha que vinha da neve... Para mim, o efeito era o mesmo..

Costumavam existir uns pilares de pedra a impedir os veículos de passar para esse caminho relvado. Noutro dia, ao passar, vi que tinham cortado uma das oliveiras e imediatamente pensei: "Ó não! Que não seja a minha Oliveira!". Sim, tenho uma oliveira preferida entre as tantas que ali estão. Uma cujo formato e sorte permite que me sente nela, como se de um assento se tratasse, a usufruir da sua sombra. Sombras... tão acolhedoras que são, debaixo deste imenso sol. As pessoas costumam se abrigar nelas ao invés de esperar o autocarro na escaldante paragem, com o sol a bater.
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É por isso e por outras que me custa presenciar certas coisas. A Carris faz paragens que são um atentado aos princípios práticos. De Inverno, deixam entrar água por todo o lado. Os assentos estão sempre encharcados. Uma vez procurei abrigo da chuva numa paragem e acabei mais molhada do que se tivesse continuado na rua, com o guarda-chuva. A água escorria pelas aberturas, salpicava como uma torneira aberta no assento metálico e fazia ricochete para as pessoas. Não se conseguia estar à beira, por causa da chuva e da água a escorrer do telheiro. Não dá para encontrar um maior abrigo no fundo, porque é aberto e a água consegue entrar melhor, escorrendo pelos veios do telheiro. Arre! Cheguei a casa com o casaco molhado em sítios onde não pensei ser possível ficar. Até os bolsos das calças estavam molhados pelo interior! E o casaco era comprido... No Verão, o alumínio e os vidros das paragens da Carris acumulam o calor que até queima uma pessoa ao contacto. Mas o pior das paragens da Carris, são os seus estúpidos cartazes publicitários. Colocados de modo a bloquear totalmente a visibilidade. Normalmente vêm-se as pessoas a esperar de pé, junto à berma, para conseguirem avistar o veículo a se aproximar. Não dá para esperar sentado porque se corre o risco do autocarro passar a grande velocidade sem parar.
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Agora resta-me aguardar para tentar perceber o que vai acontecer ao meu recanto de paz. Onde se fazem vias para passar carros, acaba sempre que se destrói a natureza. O peão vê-se privado do ar mais puro que a mesma traz e, além disso, tem de contornar novos obstáculos, os próprios carros, muitas vezes estacionados individamente. O ar da cidade, já de si pouco recomendável para a saúde, a ser prejudicado pelo extermínio deste recanto que oxigena! Tubos de escape a passar perto, a substituir o perfume de flores, de rosas e outras tantas... estou a me sentir de luto.

7 comentários:

  1. Minha querida... deixa-me que te dê uma explicação muito espiritualista acerca desta tua experiência. São belos e importantes os jardins exteriores; mas mais belos e importantes ainda são os jardins interiores, que podemos semear e cuidar todos os dias dentro de nós mesmos... e acredita que esses te trazem uma felicidade muito superior!! Porque não há estúpida estrada nem estúpidos sinais que o possam destruir... :) Ele está no teu interior, acompanha-te onde quer que vás. Claro que isso não retira a estupidez da construção da estrada e dos sinais... mas cada um terá de se haver com as consequências dos seus actos... e quem destrói assim um pequeno recanto de Natureza certamente terá o retorno do que fez. Porque isso sucede sempre, nós é que nem sempre conseguimos compreender. E isso, independentemente do facto de tu teres um jardim interior onde te refugiar ou não.

    O jardim de que falas, foi-te emprestado; neste mundo, tudo nos é emprestado, umas coisas mais, outras menos, e apesar de gostares dele, fizeste alguma coisa para que se mantivesse? Provavelmente não... se ao menos o tivesses amado como dizes, se ao menos o tivesses cuidado... e embora eu agora fale sem saber, se calhar até atiraste lixo para o chão algumas vezes... se calhar até pisaste a relva algumas vezes... o jardim não vai acabar, porque neste mundo nada acaba, tudo se transforma... sobretudo algo tão belo e sublime... deve persistir em algum outro lugar, estou certa disso... :)

    Talvez queiras procurá-lo em outro lugar... é normal do ser humano essa atitude; é suposto que as coisas continuem, afinal de contas elas nunca começaram, elas já existiam, sempre existiram, a sua manifestação material despertou em nós e sua consciência, que pede para se continuar a completar; criou-se um défice cognitivo, um espaço em branco, um vácuo que pede para ser preenchido... procuramos pelo que ficou a faltar ali.

    Poderás até, um dia, daqui a muito tempo, encontrar esse jardim... mas quando algo nos é retirado é sinal de que devemos trabalhar a nossa consciência se o queremos reaver. Aprimora-te como pessoa, expande a tua consciência, formula o teu desejo e liberta-te dele, com amor. Essa é a melhor forma de conseguir que o teu desejo se realize.

    ;)

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  2. Cara vizinha porcelana,

    Tenho-me como uma pessoa bem privilegiada em jardins interiores, estrelas cadentes, luz, paz e tudo o mais... :)! E como!

    Fico triste se, de facto, o "jardim" que é de todos, desaparecer para dar lugar a uma estrada. Coisa que ainda não confirmei em nenhum lugar. Mas para que servem sinais de trânsito em passeios, não é verdade?

    Quando souber mais, contarei. Entretanto, não é preciso desenvolver muitas teorias, como um conhecido meu, que começou a dizer que seria por cauda da Gripe A (ao lado existe um posto médico desactivado que ultimamente tem estado a ser guardado por uma pessoa que usa uma máscara).

    Muitos outros devem ter as suas experiências para contar sobre este espaço. As pessoas que se preservam à sombra das árvores, por exemplo. Nem todos o podem dizer, mas sou crente que mais alguém desenvolveu um sentimento de apreço pelo espaço.

    E já agora, não deito lixo para o chão. Posso até andar a "passeá-lo" de um lado para o outro, e ás vezes, traze-lo de volta para casa. Mas para o chão não vai.

    Mas disses-te uma coisa bonita: aquilo que existe neste mundo é-nos emprestado. Até a própria vida!

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  3. Humm.. pela maneira como o exterior te afecta, tantas vezes no sentido negativo, eu não diria... não estou a criticar, atenção, simplesmente acho que esses jardins necessitam de mais cuidado e atenção. É apenas uma sugestão. :)

    O jardim não é de todos... o jardim é daqueles que lhe souberem dar valor e respeitar. Neste mundo, se alguma vez "possuímos" alguma coisa, é apenas assim, pelo respeito, não através da mentira, da traição e do desrespeito.

    Certamente, de facto, não eras tu a única pessoa a dar valor a esse espaço... outras pessoas também dariam, mas cada um tem o seu percurso e talvez no caso das outras pessoas a situação sucedesse de outra forma. Ou se desenvolvesse de outra forma.

    Gostei da tua atitude quanto ao lixo!! :) Eu faço o mesmo!!

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  4. Por isso mesmo! Há que ter uma sensibilidade interior maior, para lamentar o exterior... ou não? Mas não te preocupes... tenho os jardins interiores mais belos do mundo! Depois, dizem que os blogs são uma espécie de alter-ego. Serão? Não sei... então se este é o lado mais feio, é bem bonito:)!

    Há! Parece que aquilo não vai virar estrada, mas não deixa de ser um local para acolher quem se julga infectado pelo H1N1... iuppi!!

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  5. Mais uma vez tenho de comentar embora saiba q nao vai aprovar....

    AS PARAGENS não são da Carris, mas sim da JC DECAUX ou da Cemusa, e estão na via com concessão da c.m.l. Enrtendidos?

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  6. Ou seja: quando é preciso apurar responsabilidades, são tantos os envolvidos que tudo fica em águas de bacalhau?

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